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sábado, 23 de fevereiro de 2013

Como ganhar a guerra econômica contra o Irã

Se o Irã não abandonar seu programa de armas nucleares, uma coisa é certa na estratégia adotada por Washington em relação à República Islâmica: haverá mais sanções. Por outro lado, também é inevitável que, quanto mais as medidas econômicas afetarem os iranianos médios, mais controvertidas elas se tomarão, principalmente na Europa.

Portanto, os EUA e aliados deveriam se antecipar e minar a insistência do Irã numa falsa crise humana afim de enfraquecer o compromisso global com as sanções. Uma vitória na guerra econômica exige também uma vitorianas relações públicas.

Poderemos discutir se as sanções, que cortaram pela metade as exportações de petróleo iranianas, frustraram as aspirações do líder supremo Ali Khamenei. Entretanto, a discussão é em grande parte irrelevante. O presidente Barack Obama usa as sanções pela mesma razão que o presidente George W. Bush as usou: elas são o único recurso não militar para coagir o regime de Teerã que viola todos os acordos e se rejeitas as inspeções.

As sanções seriam ainda mais cruciais depois de um ataque preventivo americano ou israelense sobre as instalações nucleares no Irã. Qualquer que fosse a gravidade dos danos, americanos e europeus não iam querer que fossem reparados. Por isso, as autoridades em Washington prometeram sanções ainda mais rigorosas.

É por esse motivo que deveriam ficar alarmados com as recentes reclamações do governo iraniano e de ONGs ocidentais bem intencionados, segundo as quais as pressões exercidas em toda parte lideradas pelos EUA estão causando falta de remédios, de leite em pó e de outros produtos de primeira necessidade.

Não acreditamos nas denúncias de que as sanções estejam ameaçando vidas de civis. O regime clerical pode usar as receitas do petróleo para comprar o que for necessário para evitar uma crise humana. Não existem sanções contra as importações de alimentos ou medicamentos no Irã. Os crescentes problemas de saúde na República Islâmica estão muito mais relacionados à corrupção e às preferências de gastos do regi me do que às sanções.

Mas os EUA precisam ser honestos e abertos em suas medidas a fim de também serem claros a respeito dos meios , necessários para impedir que os iranianos doentes acabem morrendo. O governo Obama e o Congresso pretendem tornar as sanções suficientemente rigorosas para obrigar Khamenei a fazer uma escolha fundamental - o regime ou a bomba antes que o programa nuclear atinja o ponto em que lhe seja possível construir rápida e secretamente uma bomba. Os EUA e aliados europeus querem que a elite governante iraniana - que travou uma profunda luta interna, uma guerra devastadora com o Iraque, e há mais de 30 anos enfrenta uma queda constante do padrão de vida - tenha medo das consequências políticas de um colapso econômico.

Considerando o progresso do regime no campo nuclear, serão necessárias novas sanções para paralisá-lo imediatamente. Um recente relatório do Projeto sobre a Estratégia de Não Proliferação EUA-Oriente Médio destaca meados de 2014 como a data na qual Teerã deverá atingir a "capacidade crítica" de produção de urânio enriquecido para a construção de uma bomba antes que a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) ou os serviços de inteligência ocidentais possam detectar.

Os iranianos poderão chegar lá ainda mais depressa se conseguirem operar as modernas centrífugas recentemente instaladas ou aperfeiçoar seu reprocessamento de plutônio, como anunciou há pouco. O pior é que as centrífugas mais avançadas são mais fáceis de ocultar, pois exigem um volume de água e laboratórios menores.

Contra essa ameaça, nos encontramos com uma arma de certo modo pouco prática. Não existem "sanções inteligentes" que permitam punir a elite iraniana e poupar o homem comum. O Irã tem uma economia profundamente socializada e a Guarda Revolucionária, que supervisiona o programa nuclear, é responsável por praticamente todo o setor econômico, principalmente na área de energia. É impossível atingir os guardas ou Khamenei sem abalar toda a economia.

O fato de o regime controlar a economia iraniana foi a base para as sanções aprovadas por Obama no mês passado, que criam uma estrutura muito mais forte para o embargo comercial imposto pelos EUA ao Irã. Elas têm como alvo as companhias estrangeiras que têm negócios com os guardas ou com entidades iranianas que fazem parte do governo, ou atuam como seus agentes ou instrumentos. A não ser que as companhias estrangeiras vendam produtos de primeira necessidade, ou sejam beneficiadas por exceções limitadas relacionadas às compras de petróleo, precisarão encontrar um parceiro privado sem ligações com os guardas ou o governo. Em setores estratégicos dá economia iraniana, isso é praticamente impossível.

As autoridades americanas também decidiram endurecer o embargo financeiro para atingir as reservas em divisas estrangeiras que o Irã mantém em bancos no exterior. O Congresso prepara uma legislação destinada a convencer o Banco Central Europeu (BCE) a fechar o acesso ao seu sistema de pagamento em bancos europeus a toda instituição financeira que ajuda o Irã a usar ou transferir seus ativos em euros. Isso é possível, pois essas transferências em euros são processadas por meio do sistema de pagamentos interbancários Targetz do BCE. As diretrizes do BCE proíbem o acesso ao Target para as , pessoas que praticam "lavagem de dinheiro, financiamento do terrorismo, atividades nucleares sensíveis em termos de proliferação e desenvolvimento de sistemas de lançamento de armas nucleares". Essa linguagem descreve literalmente o regime iraniano.

Em que resultariam todas essas novas medidas? Muito provavelmente no colapso da moeda do Irã nos próximos 18 meses. Neste caso, o governo Obama precisará se preparar desde já para os inevitáveis efeitos. O governo de Bill Clinton não estava preparado na questão do Iraque. Talvez as sanções da ONU lideradas pelos americanos tenham sido decisivas para dissuadir Saddam Hussein nos anos 90 a dar prosseguimento a seu programa de armas de destruição em massa. Mas na guerra de relações públicas, os EUA foram profundamente abalados, em grande parte porque o regime iraquiano violou consistentemente o intercâmbio para fins humanitários, e a Casa Branca não conseguiu responder às críticas da Europa e de outras regiões, segundo as quais as sanções estariam causando um desastre humano - como as denúncias de que as operações americanas matavam milhares de criancinhas iraquianas todos os meses.

Críticas semelhantes ao tratamento destinado por Washington ao Irã já estão chegando à Europa e a instituições globais da área de saúde. Mas à medida que elas afetam mais profundamente a economia iraniana, e no caso de o regime melhorar suas relações públicas, o sentimento contrário às sanções poderá aumentar rapidamente na Alemanha, a principal parceira comercial europeia do Irã. Na Europa e nos EUA, onde muitos círculos de política externa já concordaram que o Irã tenha a sua bomba, as sanções poderão parecer gratuitas, cruéis e contraproducentes.

Com sua inação na Síria e a nomeação de John Kerry ao cargo de secretário de Estado, e Chuck Hagel como secretário da Defesa, o governo Obama deixou claro que tem pouco interesse em novas intervenções militares no exterior. A guerra econômica deverá se alastrar cada vez mais. Na realidade, as sanções afetam profundamente o homem comum assim como afetam esse regime cruel, mas a desvantagem para os ocidentais avessos ao risco não é tão grande quanto a possibilidade de um prolongado conflito no exterior. / Tradução de Anna Capovilla. Fonte: Estadão

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